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A porta está aberta para desenhar ou ser desenhado no Salão 40

Aceitam-se voluntários no grupo informal de pessoas apaixonadas e dedicadas ao desenho de modelo ao vivo, que há mais de década e meia se reune semanalmente no Ateneu de Coimbra, à Alta da cidade.

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Fotografia: Mário Canelas

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Ouvem-se as vozes quentes de Ella Fitzgerald e Louis Armstrong a toda a dimensão do salão. «Heaven, I’m in heaven», suaves palavras pairando sobre o soalho, preenchendo o espaço e embalando o espírito. De cada vez que o Salão 40 se reúne, esta e outras músicas acompanham o bailado de dedos que os desenhadores fazem com o papel, gestos feitos com tintas e lápis, em que cada um dos elementos do grupo representa o modelo à sua frente. O exercício do desenho é a expressão artística mais honesta, a mais primordial. Vinte pessoas terão diferentes técnicas e múltiplos resultados diferentes, a diversidade pura na expressividade artística.


O Salão 40 é um colectivo informal de pessoas interessadas no desenho do corpo humano e que se junta todas as terças-feiras à noite no Ateneu de Coimbra, um edifício histórico da Alta da cidade, fundado em 1940. O grupo organizou um semicírculo de mesas em torno de um estrado, onde se posiciona a modelo. Os modelos podem ser homens, mulheres, de todas as idades e feitios, o objecto é indiferente, o interesse aqui é pelo desenho e pela arte. Por vezes em seminu, noutras vezes vestido, hoje em nu. O tempo para cada pose é crescente, começa com alguns minutos e vai aumentando até se obterem poses de vinte minutos ou meia hora. Terminado o tempo da pose, a modelo reconfigura o seu corpo e os desenhadores recomeçam o desenho, ciclicamente.

«Dedicar a atenção a um corpo humano ajuda a perceber a beleza de todos os corpos e a beleza do ser humano. Não nos conhecemos uns aos outros, vimos de sítios, educações e áreas diferentes. Uns usam carvão, outros aguarela, outros todas as cores e alguns só preto. Mas, de alguma forma, durante as duas horas da sessão, partilhamos algo. Não tenho bem a certeza do que é, só sei que todos nós voltamos. Por isso sei que é uma coisa boa»

Inês Lacerda

No início era o desenho

As sessões do Salão existem desde 2006. O ilustrador André Caetano e os arquitectos Bruno Gonçalves e Eduardo Conceição, falam em representação dos elementos fundadores. Desse grupo inicial faziam também parte Eduardo Mendes (escultor), Cláudio Vidal (actor), João Currais (pintor), João Correia (agora é escritor, entre outras coisas, de Bruno Aleixo), José Palrinhas (Designer de Equipamento), António Monteiro (Arquitecto), António da Costa (Escultor). Depois juntar-se-ia ao grupo o ilustrador Carlos Drave.


Comentam esses passos iniciais: «O Salão nasceu da necessidade de continuarmos a desenhar o corpo humano. Tivemos aulas [de desenho] com modelo na Escola Universitária das Artes de Coimbra (a extinta EUAC, mais conhecida como ARCA), mas apenas durante dois anos. Começou por acontecer na sala de desenho da EUAC, mas a limitação de horário que nos impunham fez com que se mudasse para o Ateneu. Esta mudança foi possível através da Fátima Januário, que era madrinha de uma das pessoas que fazia parte do Salão. Em troca do espaço, alguns membros faziam oficinas com idosos que frequentavam o Ateneu. Também se fizeram duas exposições dos desenhos das sessões na sala onde decorreram as sessões».

A ideia do nome surgiu no número 40 da Rua de Saragoça, uma casa onde realizaram, durante algum tempo, exposições dos desenhos do Salão, declamação de poesia, entre outras coisas. Continuam: «[Chamámos-lhe] “Salão” um pouco em forma de piada em relação aos “Salon des refusés” e “Salon des Indépendants” franceses (ver marcador em cima). Éramos um grupo auto-formado à margem do mainstream e surgiu a necessidade de termos o nosso próprio espaço e fazer a nossa própria curadoria. Chegámos perto das ideias de anti-museu, ou seja, de espaços alternativos para a arte contemporânea. Os modelos eram estudantes, actores, amigos, que faziam parte do círculo de amigos de quem organizava ou que alguém desse círculo conhecia. Muitos modelos eram amadores, alguns modelos eram actores ou dançarinos e traziam com eles algo de novo e interessante».

André Caetano comenta sobre aquilo que procurava no Salão: «Era estar a desenhar com outros artistas, quase todos meus amigos, num ambiente relaxado e de partilha. Tínhamos à vontade para criticar os desenhos uns dos outros, o que nos ajudava a evoluir e, na verdade, a praticar algo que na nossa vida profissional iria ser normal, ter revisões críticas. Também fazíamos trocas de materiais em algumas sessões, para experimentar coisas novas. Tudo isso ajudava imenso a crescer como desenhador».

Desenhar por gosto

A. Luísa Delgado, que está a concluir o curso de Medicina, é a actual organizadora do Salão, porque, como diz: «planeio a realização das sessões». Ela explica que: «Desde o começo senti que o Salão era um lugar muito dinâmico com idas e vindas de pessoas e em que a organização ia sendo herdada e assumida de acordo com a disponibilidade de cada membro. A pandemia veio hibernar um pouco os nossos encontros e chegámos mesmo a ficar parados à conta disso. Somente após esse período é que comecei a assumir o cargo [de organizadora], dado que já conhecia as dinâmicas e conseguia facilmente encontrar modelos».

E como arranja Luísa os modelos? «Acabam por ser pessoas com quem me vou cruzando e que manifestam interesse na experiência. Uma conversa numa saída à noite ou até numa ida ao teatro pode germinar a possibilidade de alguém vir a ser modelo. E eu colecciono essas pessoas caso se comprometam com o Salão. Por vezes temos alguns modelos profissionais que vêm a Coimbra propositadamente fazer as sessões, que adoramos sempre receber».

Como grupo informal que se reúne semanalmente com o interesse de desenhar, Luísa explica que «não há uma componente lúdica de aprendizagem por parte de um professor». Sobre o seu percurso ser algo distante das artes, como o de outros integrantes do Salão, clarifica: «Desde que me entendo por gente que me encantavam as áreas das artes. Todavia, a proximidade que tinha foi-se dissipando com as escolhas que fiz, mas nunca deixei de desenhar e pintar. Mas sentia que era algo fortuito e precisava de construir um hábito. A procura incessante dessa proximidade a um quotidiano artístico levou-me ao encontro do Salão, no qual permaneço regularmente desde 2018. Descobrir o desenho do corpo humano foi, e é, algo extremamente meditativo para mim».


O grupo concentra-se no modelo, ensaiam traços, capturam o corpo, há uma comunhão serena na sala. Francisco Aldeão procura poses dinâmicas. Marco Moura e Luís Gomes levam anos disto, a agilidade e talento com que desenham comprovam-no. Rui Gaspar partilha a sua necessidade de desenhar, a que chama de «vício bom». Paula Brito, docente de Artes Visuais, comenta: «Desenhar no Salão tem sido uma experiência enriquecedora. É sem dúvida um momento de prazer, de descontracção e relaxamento. Desenhar para mim é uma terapia, faz-me bem à alma!»

Inês Lacerda, que é designer gráfica e artista, diz: «O Salão é um refúgio, para mim e para todos os que lá vão. Para mim é uma oportunidade de desenhar ao vivo com modelos nus, algo que nunca fiz nem na licenciatura nem no mestrado. É um momento na minha rotina semanal que dedico simplesmente ao prazer de desenhar. Não tenho de responder a nada nem a ninguém. Só a minha mão e o que sinto no momento. Tornou-se num ritual para mim, como uma meditação. É também um sítio seguro, não há competição por uma boa nota ou um emprego. Não importa quem é melhor ou pior porque isso é subjectivo. Quem quiser pode partilhar os desenhos e quem não quiser não partilha».

Esta abertura e generosidade faz com que quem chegue se sinta acolhido. Marta Teixeira, uma das mais recentes participantes, comenta: «O que me trouxe ao Salão foi uma necessidade pessoal e profissional, não conhecia nenhum sítio [em Coimbra] onde pudesse desenhar modelo ao vivo e o Salão dá-me essa possibilidade. A satisfação que me deu desenhar no Salão foi que estamos todos lá para o mesmo e isso faz com que haja bom ambiente.

Inês acrescenta: «Dedicar a atenção a um corpo humano ajuda a perceber a beleza de todos os corpos e a beleza do ser humano. Não nos conhecemos uns aos outros, vimos de sítios, educações e áreas diferentes. Uns usam carvão, outros aguarela, outros todas as cores e alguns só preto. Mas, de alguma forma, durante as duas horas da sessão, partilhamos algo. Não tenho bem a certeza do que é, só sei que todos nós voltamos. Por isso sei que é uma coisa boa».

Para Luísa «o Salão é um lugar seguro e reverente em que o mais fulcral interesse dos participantes é a intenção de aperfeiçoar a sua técnica de desenho, pintura ou qualquer outro veículo artístico, encontrando nele o espaço possível para que tal aconteça. Quem tiver interesse em posar ou desenhar pode contactar-nos (vejam o marcador em cima). Toda a gente é convidada a participar desde que respeite as interacções prévias do grupo, o modelo e também o espaço. O Ateneu permanece a incubadora perfeita para o nosso projecto, pretendemos continuar a utilizar o espaço, respeitando-o».

Posar e ser modelo

O modelo da noite é Beatriz Magalhães, modelo na área da fotografia, desenho e pintura há quase uma década, trabalhando online para o estrangeiro e também para eventos e encontros anuais de desenhadores, entre outros trabalhos. Comenta sobre o seu trabalho como modelo para desenho ao vivo: «Sou uma peça de arte para a criação de outros artistas. Sendo artista, isso faz-me sentir muito bem pois dou da mesma forma que recebo, assim funciona o mundo da arte para mim».


Beatriz posa em nu artístico para o Salão, alternando posições corporais consoante lhe pedem ou conforme lhe dita a experiência. Nem sempre os modelos do Salão posam em nu, há também quem pose seminu ou vestido. É sempre variável porque dependerá dos modelos que estejam em carteira. Haverá uma ou outra vez que um dos membros do Salão tenha que posar para cobrir a ausência de modelo.

Sobre o posar nu, Beatriz diz: «Sinto que nasci para trabalhar com o nu, todo o meu trabalho e criação roda em torno destas áreas. Tenho uma grande abertura com a exposição do meu corpo, não me importo de ser vista, olhada. Sinto que o corpo nu é algo natural e humano, diria até animal. Sou um pouco fora da caixa por pensar neste formato. Portanto, para quê ter julgamentos? Sinto-me mais fragilizada com capas e roupas do que nua. Sinto-me forte, poderosa e diria até superior quando me apresento nua. Sou eu. Indiferente sobre olhares ou questionamentos. Sou felicíssima e realizada com o trabalho que produzo». 

Dificuldades e desafios

Como grupo informal, existem diversos desafios para o Salão. Para já, o contexto, como lamenta Inês: «Tenho pena que não existam mais iniciativas culturais e artísticas e tenho pena que as pessoas não adiram tanto. Tenho a certeza que há muito potencial nesta cidade e muitas pessoas que, como eu, estão desejosas de testemunhar isso. Espero que a cidade cresça nesse sentido».Luísa conclui: «Como o Salão é um grupo muito dinâmico e volátil, a principal dificuldade é perceber se haverão membros suficientes para assegurar que a [próxima] sessão aconteça».

O custo da sessão é variável, de 1,5€ a 4,5€, e reúne com um mínimo de 7 ou 8 pessoas, para justificar o valor pago ao modelo, daí a dificuldade apontada. Luísa prossegue: «[Já] a procura de modelos dependerá muito de quem está no momento a organizar as sessões. Pessoalmente, tendo a oportunidade de não ter ainda muitas responsabilidades e ter uma vida social consideravelmente activa, acabo por encontrar facilmente quem tenha interesse em posar, até porque nos divulgamos muito ‘boca a boca’. No entanto, a procura de novos membros regulares e de modelos é o cerne do Salão. Quem considere um dia juntar-se ao grupo de qualquer uma das formas, não hesite em contactar-nos».

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