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Famílias de Coimbra continuam a acolher famílias de refugiados da Ucrânia com «confiança absoluta»

Recém-chegados falam numa convivência e cumplicidade que vão muito além do mero acolhimento, que acontece desde que começou a guerra no país com a Rússia. Falámos com cidadãos já empregados mas quem presta apoio oficial no terreno fala em dificuldades na procura de habitação a preços acessíveis.

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Fotografia: Mário Canelas; Marta Melo

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Oleksandra Taran deixou Dnippro com a mãe e a filha a 5 de Março. Demoraram 12 dias para chegar a Coimbra. Nikita Dudarenko saiu de Kiev com a mãe, a avó e a irmã cerca de uma semana depois da invasão, a 24 de Fevereiro. Depois de uma curta estadia em Lisboa, mudaram-se para Coimbra em finais de Abril, trazendo consigo Iryna Voituk, que estava sozinha. Todos foram acolhidos por Armando de Vasconcelos Cardoso: «Quando temos possibilidades temos o dever de consciência». 

Paula Costa é repetente no acolhimento de estrangeiros. Replica um gesto feito à sua família nos anos 60 do século passado, quando o pai, que fez guarda de honra ao General Humberto Delgado, teve de deixar o país por haver «fortes probabilidades de vir a ser preso». «Foram 11 dias a pé. Chegou com um sapato, mas abriram-lhe a porta. O facto de alguém ter-lhe aberto a porta, para nós, naquela altura, significava bastante», conta emocionada no dia em que a família de ucranianos que acolheu se mudou para uma nova casa, cedida igualmente por voluntários. Neste processo, Paula Costa estimava uma estadia provisória, mas que acabou por durar um mês e meio. «Agora preciso de descansar. Preciso do meu equilíbrio», conta-nos, não excluindo a possibilidade de vir a abrir de novo as portas do seu apartamento no centro de Coimbra.


Dada a situação na Ucrânia, nenhuma destas famílias hesitou em avançar com o acolhimento de refugiados. Paula Costa conta que disponibilizou a sua casa, logo nos primeiros dias de invasão, no grupo «Consultores Imobiliários pela Ucrânia», através das redes sociais. As primeiras mensagens trocadas com Oleksandra Taran aconteceram quando ela ainda estava na Ucrânia. «O contacto foi-me dado por um voluntário», recorda a engenharia informática. 

Armando de Vasconcelos Cardoso inscreveu-se no Banco de Famílias de acolhimento da Câmara Municipal de Coimbra, uma via criada pela autarquia com apoio de várias entidades locais, que permitiu o acolhimento de cerca de 30 famílias refugiadas da Ucrânia. Com o apoio da própria família, adaptou as instalações antigas da empresa familiar, contíguas à casa particular, onde nos receberam para esta conversa. As mudanças tiveram de passar pelo crivo camarário: «Por uma questão de segurança», atira o empresário de 87 anos.

«Vejo-os como uma família»

«Faço a minha vida normal. Elas entram e saem. Têm a chave. É confiança absoluta. No dia em que quebrar a confiança saem, mas nunca aconteceu», descreve Paula Costa sobre como lida com o acolhimento na sua casa. Neste processo, a professora desdobrou-se em esforços para ajudar a família Taran, por exemplo na escolha de uma escola para a criança menor, nas opções de aulas de português e mesmo com contactos que fez para ajudar Oleksandra a encontrar um emprego. «Há imensos ucranianos a chegar e eles [as autoridades oficiais] não conseguem. Humanamente é impossível», lança Paula Costa. 

«A Paula faz tanta coisa por nós e não é só ajuda, é afecto e carinho. Mostrou-nos a cidade e leva-nos a ter com os amigos. Levou-nos a ver o mar, que nunca tinha visto»

Oleksandra Taran


Uma situação que se repete também com a família recebida por Armando. «Em todos os organismos oficiais ponho as minhas reticências. Somos nós que temos de decidir arregaçar as mangas e fazer», diz o empresário. A seu lado, a nora, Clara Correia, acrescenta: «Acho que a forma mais natural de se fazer esta integração na sociedade e na vida activa é connosco, a família que acolhe».

A convivência entre as famílias tem-se estendido para além do simples acolhimento porque, como diz Paula Costa, quando se pensa em acolher tem de ser no real sentido da palavra. «A Paula faz tanta coisa por nós e não é só ajuda, é afecto e carinho. Mostrou-nos a cidade e leva-nos a ter com os amigos. Levou-nos a ver o mar, que nunca tinha visto», resume Oleksandra Taran, para depois percorrer toda a mesa para um abraço emocionado à anfitriã. 


A cumplicidade entre as famílias portuguesas e ucranianas é também visível na casa de Armando. «Olho para eles e não os vejo como refugiados. Vejo-os como uma família. Eles sabem disso e fazem-nos saber que sentem isso», atira Clara Correia. Nas famílias de acolhimento, o sentimento que prevalece é o de dar sem esperar nada em troca. «Estou cansada, mas é para continuar a fazer e dispensar o esforço e o tempo que for preciso», finaliza.  

O emprego como uma porta para a integração

Iryna Voituk já trabalha na empresa de Armando de Vasconcelos Cardoso, a Campilusa, e em breve será a vez de Nikita. Aos 29 anos, a ucraniana está feliz por ter encontrado uma ocupação: «Não gosto de estar parada e é aborrecido estar em casa o dia todo sem fazer nada. É bom estar a trabalhar». Nos primeiros dias parecia nervosa, mas agora já está mais desenvolta e «já brinca». A descrição é feita pela colega que a orienta nas tarefas diárias, enquanto nos mostra uma lista de tarefas traduzidas para ucraniano.  


Nesta família, a mãe de Nikita, Olena Dudarenko, tem já garantida colocação no supermercado Auchan, o mesmo em que trabalhava na Ucrânia. Falta apenas conseguir uma ocupação para avó. Oksana Denisova é florista e estão a fazer um portfólio do seu trabalho. «Já fiz uma pesquisa das quintas onde se realizam eventos à volta de Coimbra. Há cerca de 24. Quando o portfólio estiver feito eu, no meu tempo livre, vou começar a fazer estrada com a Oksana para apresentar o trabalho dela nesses locais», diz Clara Correia.

Com um trabalho, as famílias ucranianas sentem-se a dar um primeiro passo para recomeçar as suas vidas, apesar das incertezas sobre o futuro. «Agora tenho de começar a trabalhar e ajudar a minha família e depois não sei. Talvez fique aqui, talvez vá para a Ucrânia. Tenho de fazer alguma coisa», diz-nos Oleksandra Taran, em vésperas de começar a trabalhar. 

«Olho para eles e não os vejo como refugiados. Vejo-os como uma família. Eles sabem disso e fazem-nos saber que sentem isso»

Clara Correia

A barreira da língua é uma das maiores dificuldades no processo de integração, com o inglês e as novas tecnologias a serem os principais aliados. O contacto com os portugueses é ainda visto como uma forma mais rápida para dominar a língua. Pelo menos para Olena Rakovska, em Coimbra com o filho, desde meados de Abril. Proveniente de Kherson, a professora de educação física tem já em vista um emprego numa área diferente. «É o princípio e preciso de sustentar-me. É melhor para mim estar inserida na sociedade portuguesa para que possa falar e ouvir a língua», conta-nos no final de um encontro da comunidade ucraniana no Largo da Portagem. 


A pensar neste obstáculo, a AMI-Assistência Médica Internacional prepara uma resposta: «Há vários cursos [de língua portuguesa] em Coimbra, mas estão todos muito cheios, obviamente. Nós vamos tentar, nós próprios, arrancar com uma acção dessas», diz-nos Paulo Pereira, para quem o domínio da língua portuguesa é meio caminho andado para a integração laboral. 

Para facilitar a integração, Olena Petryk, a viver em Portugal há 20 anos, considera necessária uma maior articulação com os ucranianos já instalados no nosso país. Petryk diz encontrar muitos conterrâneos com dificuldades de entenderem e de se fazerem entender, o que dificulta todo o processo. «Acho que [a comunidade de refugiados] deveria ser mais acompanhada por forma a ter tradutores presentes. Era mais fácil para se integrarem. E em vez de passar um dia todo, por exemplo, na Segurança Social passava uma ou duas horas».

É urgente mais habitação

Apesar do acolhimento de famílias ser fundamental, quem trabalha no terreno começa a sentir dificuldades em encontrar uma casa a preços acessíveis, atira Paulo Pereira. «Acontece que os que chegaram há um mês e meio estão a começar a ter que procurar outros locais para viver. Não tendo dinheiro ou não estando a receber os apoios da Segurança Social torna-se complicado. Coimbra tem uma grande dificuldade de ter um mercado de arrendamento de casas que seja sustentável. Precisávamos de muitas casas entre os 300 e os 400 euros para que estas pessoas pagassem com aquilo que estão a receber da Segurança Social». 

O responsável lamenta o facto de não haver uma «cama pública» para responder a estas situações em Coimbra, onde funciona apenas o Centro de Acolhimento no Hospital Militar como solução provisória à chegada. «Não fossem as famílias de acolhimento da sociedade civil não havia um sítio onde as pessoas ficassem. Nós, país, não podemos depositar na sociedade civil o ónus de ter que acolher nas suas casas estas pessoas».

A mesma dificuldade é retratada pelo presidente da Junta de Freguesia de Souselas e Botão. Segundo Rui Soares, desde que a rede de transportes públicos para a freguesia foi melhorada houve «muita procura de casas para arrendar». «Isso está-nos a dificultar, de certa forma, o arranjo dessas moradias», diz Soares, sobre a situação na freguesia que acolhe quatro famílias de ucranianos. 

Por mais apoio psicológico

Com o fluxo de chegadas de refugiados ainda elevado, Olena Petryk reivindica apoio psicológico. A necessidade torna-se maior quando se fala de famílias acabadas de chegar, por terem sentido mais o efeito da guerra entre a Ucrânia e a Rússia. «Aqueles que estão a chegar agora é que realmente passaram o inferno. No início, quando [a guerra] rebentou, [as pessoas] começaram a fugir, mas agora são cada vez mais e está a chegar gente que passou por bombardeamentos, passou fome.» E Olena dá exemplos das marcas deste conflito: «As crianças estão traumatizadas e a qualquer barulho assustam-se. Quando batemos à porta elas ficam assustadas, fogem e escondem-se debaixo das camas».


Para promover a integração da comunidade ucraniana recém-chegada a Coimbra, Petryk organizou um encontro Largo da Portagem. O objectivo era, além do convívio e de repetir o apelo à paz na Ucrânia, dar-lhes a saber «que não estão sozinhos e que têm apoio dos portugueses e dos ucranianos que estão aqui há muito tempo». O dia escolhido foi simbólico: 8 de Maio, dia em que se assinalaram os 77 anos do fim da II Guerra Mundial. 


Neste percurso de adaptação, a AMI tem vindo a garantir acompanhamento a todas as famílias, não descurando a parte psicológica. Segundo Paulo Pereira, o trabalho passa por ajudá-los a «fazerem as pazes com o seu presente, na medida do possível». «Estamos a trabalhar esta questão de terem muita esperança de que as coisas vão melhorar, ficando aqui ou voltando à Ucrânia. O que importa é o presente deles e todos têm o seu tempo».

Em termos de ajuda, o responsável da AMI sente que lida com pessoas com muita resiliência e que «só aceitam o que necessitam». «Podemos querer dar um saco com alimentos, mas se eles já tiverem em casa dizem “não, eu agora não preciso”. «Isto é algo novo para quem trabalha na área do apoio social, como eu, há mais de 20 anos», atira.

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