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Tratamos refugiados afegãos e ucranianos de forma diferente?

Conversámos com Massouda Hedayat, uma jovem afegã que fugiu de Cabul para Coimbra, para escapar à violência do regime taliban. A sua história teve um final feliz, mas levanta a questão da diferença de tratamento entre migrantes de diversos países.

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Fotografia: Mário Canelas

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Passámos uma tarde a conversar com Massouda Hedayat, afegã de 21 anos, sobre a sua vida em Cabul, as diversas tentativas frustradas de saída do Afeganistão e ouvimos atentamente o relato da sua fuga para Portugal. O último local escolhido por Massouda para este momento de partilha foi o Paço das Escolas, um ponto de referência histórico em Coimbra.

A história de Massouda teve um final feliz, conseguido pela intervenção de diversas pessoas e organizações que se mobilizaram para que, hoje em dia, viva um quotidiano sereno em Coimbra, ao lado dos pais.

A esperança de Massouda contrasta com as notícias que ainda lhe chegam de familiares no Afeganistão. «Apenas eu e os meus pais e alguns dos nossos familiares puderam fugir do Afeganistão. Continuo a ter tantos familiares e amigos que ainda estão lá. Emociono-me muito por não conseguir falar com eles normalmente; quando vejo e falo com primas, é terrível, quando nos despedimos é muito duro, é tão difícil estar lá. As mulheres, as minhas amigas, não podem fazer nada, nem sequer o ensino secundário e só podem andar na rua acompanhadas pelo pai ou marido.»

De acordo com um relatório divulgado pela Inspecção Geral Especial dos Estados Unidos para a Reconstrução do Afeganistão (SIGAR), mais de 22 milhões de pessoas precisam de apoio humanitário, estimando-se que mais de três milhões de crianças irão sofrer de desnutrição aguda ainda este ano, com um milhão de crianças a enfrentar risco de morte.

As pessoas do Afeganistão já sofreram muito, não apenas eu, mas muitas pessoas, milhares de pessoas. São como eu, como tu, como a tua mãe, irmã; não somos apenas fotografias que aparecem nas notícias, também rimos, magoamo-nos, temos sentimentos.  Somos todos humanos.»

Massouda contou-nos diversas situações de pessoas que perderam os seus rendimentos, como uma amiga que ganhava um pequeno salário, que era a base da casa, e agora deixou de o poder fazer, uma vez que não pode trabalhar.«É pura miséria». Numa realidade em que 70% dos agregados familiares relataram ser incapazes de cobrir necessidades alimentares e não alimentares básicas, o SIGAR avança também que existem relatos de famílias que recorreram à venda de rins ou outros órgãos e até venderam os seus filhos para sobreviver.

Os efeitos colaterais da guerra na Ucrânia também ameaçam agravar a crise humanitária no Afeganistão, à medida que os preços dos alimentos e dos combustíveis aumentam e surgem interrupções nas cadeias de oferta.

Em relação à Ucrânia, claro que partilho os protestos contra a guerra, apoio totalmente a paz. Mas sinto diferença de tratamento porque nós também somos humanos como eles. Porque é que as pessoas não nos aceitaram na fronteira? Porque não nos acolheram, mesmo com documentos?

A este propósito, questionámos Massouda sobre o que sente quando assiste ao desvanecimento do foco da atenção internacional no Afeganistão, agora apontado para a Ucrânia. «A minha preocupação são as pessoas que ficaram para trás, no Afeganistão. As pessoas do Afeganistão já sofreram muito, não apenas eu, mas muitas pessoas, milhares de pessoas. São como eu, como tu, como a tua mãe, irmã; não somos apenas fotografias que aparecem nas notícias, também rimos, magoamo-nos, temos sentimentos.  Somos todos humanos.» E prosseguiu: «Em relação à Ucrânia, claro que partilho os protestos contra a guerra, apoio totalmente a paz. Mas sinto diferença de tratamento porque nós também somos humanos como eles. Porque é que as pessoas não nos aceitaram na fronteira? Porque não nos acolheram, mesmo com documentos? Há jornalistas e outras pessoas que estão em perigo. Sinto as diferenças.» 

Massouda sente que o seu país tinha um exército maior do que o das forças taliban. «Eu admiro o presidente [ucraniano] Zelensky que ficou lá a lutar ao lado do seu povo. O exercito afegão não lutou, o presidente e o governo fugiram, não quiseram saber de nós, da população.»

Fila de pessoas que aguardam horas por um pedaço de pão em Cabul.
(Imagem publicada por Massouda Hedayat na sua conta no Twitter)

A soma de questões sem resposta ecoou das varandas panorâmicas do Paço das Escolas. Perguntámos a Massouda porque acha que existe essa diferença de tratamento. «Talvez porque estão num país próximo da Europa. Talvez seja racismo, mas qual a diferença [entre os ucranianos e nós]? O que é que nós fizemos de errado? Quando estamos a falar de fugir do nosso país, somos todos iguais. A nossa vida mudou numa noite, depois de vinte anos. Pegámos numa mochila e fugimos.»

De regresso ao carro, passamos em frente à Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, onde Massouda está a aprender português. Momentos antes de nos despedirmos, deixou-nos uma última partilha, sobre coragem e a paz: «Os meus pais educaram-me a querer paz com todas as pessoas. Se alguém me fizer mal, eu devo responder com paz. Eventualmente, a outra pessoa há-de perceber. Não acredito que isto funcione com os Taliban, não acredito que eles possam mudar. É muito difícil lidar com eles, eles podem fazer qualquer coisa: podem cortar gargantas se alguém faz um protesto, podem cortar um braço se alguém o levantar. As pessoas estão agora silenciosas. As mulheres afegãs são corajosas, estão a protestar e sabem que serão mortas.»

Talvez seja racismo, mas qual a diferença [entre os ucranianos e nós]? O que é que nós fizemos de errado? Quando estamos a falar de fugir do nosso país, somos todos iguais. A nossa vida mudou numa noite, depois de vinte anos. Pegámos numa mochila e fugimos.

Podem ler mais sobre a vida de Massouda Hedayat no Afeganistão antes da fuga para Coimbra, apenas conseguida pela intervenção de diversas pessoas e organizações, entre as quais a organização internacional Women in Tech, a Feedzai, o Ministério dos Negócios Estrangeiros e o Embaixador de Portugal no Paquistão.

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