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Colectivo Zás

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Bancos nas paragens de autocarro

Como um jovem colectivo pensa no que faz falta a Coimbra e zás!

Pega num serrote e constrói bancos para paragens de autocarro, organiza caminhadas exploratórias em diferentes zonas e aponta resultados. O grupo de arquitectos e estudantes quer motivar a comunidade para a reflexão e a mudança, uma iniciativa de cada vez.

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Fotografia: Mário Canelas

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Bancos nas paragens de autocarro

«A gente está a inventar, só que com algum conhecimento por trás…em teoria», dizem Artur Gama e Arthur Noronha, de régua, esquadro e pedaço de madeira na mão. Falamos com os estudantes do quarto e quinto anos de Arquitectura na Universidade de Coimbra, membros do Colectivo Zás, enquanto participam na oficina de construção de bancos de madeira que organizaram no Grémio Operário de Coimbra. Sim, leram bem, construção de bancos de madeira.

Conversámos no intervalos dos trabalhos, que também envolvem uma serra eléctrica. «Lara vai entregar a tese, o Ivan e o Gonçalo já se formaram, a Diana é do meu ano», continuam os Artures. «Oficinas são sempre uma boa ideia, há tanta coisa que não damos nas aulas.» Mas o objectivo também é outro, é «ensinar a pescar», como diz o ditado.

O Colectivo Zás foi o responsável pela colocação de bancos de madeira em paragens de autocarro da cidade, à revelia das autoridades. Uma acção do chamado urbanismo de guerrilha, para chamar a atenção para o desenho da cidade e planeamento e usufruto do espaço público. Ivan Brito pousa a serra e faz uma pausa para se sentar connosco junto à bancada. É o bracarense que nos conta a história que começou, há cerca de um ano, com Lara Reis, Gonçalo Santos, Diana Altino, Gabriela Vasconcelos, Bárbara Angelo, Frederico Ribeiro e os Artures. São eles que compõem o círculo de amigos que pensa e quer fazer pensar a cidade. 

Quando alguns acabaram o curso e começaram a ter mais tempo livre, começaram a delinear um plano de acção. «Achamos que Coimbra tem alguma falta de movimento nesta questão dos colectivos. Tanto Porto como Lisboa vão tendo algumas acções, nós já participámos em algumas, e cá em Coimbra fui voluntário na segunda edição do Há Baixa, por exemplo», conta Ivan. Mas um plano para fazer o quê? Para responder à preocupação fundamental que é o planeamento urbano, o conhecimento da cidade e o envolvimento da comunidade naquilo que é essencial para o seu próprio bem estar e para o desenvolvimento de Coimbra.

Ivan não tem meias medidas: «A cidade está parada. Falta iniciativa, tanto por parte das instituições como por parte do resto da população, que falta envolver numa construção colectiva da cidade. A cidade não costuma participar no desenho do espaço público e a nossa ideia é tentar envolvê-los, até ensinar as pessoas a trabalhar com as coisas também. Vamos criando uma rede de contactos e fazer bancos para ali, estrutura para acolá, e envolver pessoas de outras áreas também.»

Os bancos nas paragem de autocarro

Durante o mês de Agosto, começaram a aparecer bancos em algumas paragens de autocarro da cidade. O primeiro foi no Arnado. «Era o que ficava mais próximo do sítio onde construímos. A ideia foi: “OK, nós vamos montar isto e vamos sentar-nos; se resultar fazemos os outros. Aguentou-se uma semana mas depois não resistiu, cedeu e nós recolhemo-lo, porque talvez consigamos reutilizar para outras coisas», conta Ivan. Mas o plano tinha funcionado.

Seguiram-se o planalto de Santa Clara, a Estrada da Beira, a Rua do Brasil e a Praça da República. Em dois dias, o Colectivo Zás – que foi buscar o nome à Nêspera de Mário Henrique Leiria, celebrizada por Mário Viegas – fabricou com as próprias mãos mobiliário urbano, com materiais recolhidos nas ruas como lixo e guardados num armazém municipal, à espera de serem destruídos. Durante a noite, o grupo instalou os bancos noutras quatro paragens de autocarro da cidade, com um código QR e o nome Zás a identificar a autoria.

Durante dias, amigos do colectivo fizeram uma espécie de patrulha que ia verificando se os bancos estavam no sítio e, sobretudo, se havia quem se sentasse neles.

«Faltam de espaços de permanência na cidade», atira Ivan. «É muito estranho, para mim pelo menos, o desenho público da cidade não pensar em bancos. Não há espaços de permanência. Há espaços de atravessamento, há espaço público, mas é sempre de atravessamento. Não dá para uma pessoa estar sentada, relaxada a ler um livro ou no telemóvel à espera de alguém, é sempre super desconfortável.» Da preocupação, o arquitecto passou à acção e a iniciativa não passou indiferente.

«Coimbra às vezes pode ser muito violenta para qualquer iniciativa que se faça na rua. Na Praça da República [o banco] partiu, mas estamos completamente tranquilos em relação a isso, vimo-los a ser usados e vimos que são precisos, e isso bastou.»

Ivan Brito, Colectivo Zás

Outra iniciativas

O workshop continua, quase não ouvimos Ivan por causa do ruído das serras eléctricas. A um dado momento ele diz-nos que «a relação com os materiais foi-se perdendo, as pessoas estão em frente a um computador a pensar nas soluções mas depois acabam por não ter relação com a matéria prima, isto dentro do nosso ciclo de amigos, então pensámos: “Por que não também dar um workshop para as pessoas que não têm nada a ver aprenderem a mexer em ferramentas, a pensar um banco, a pensar em mobiliário, por que não damos umas noções básicas com o que sabemos? Não somos carpinteiros nem serralheiros, mas passamos conhecimento de uns para os outros.» 


O Colectivo Zás quer continuar a fazer protótipos para a cidade e ver no que resulta. «Se são completamente excluídos pela população ou se há alguma abertura para se fazer alguma coisa. A ideia é olharmos para o sítio onde pretendemos actuar e ver se é possível fazer qualquer coisa. Constatámos que é sempre possível. Na Praça da República pusemos um banco que dá perfeitamente para duas pessoas, é seguro e é usado.»

Ivan admite que há outras cidades onde o problema é pior ou mais urgente do que em Coimbra mas «o colectivo actua onde está» e já são nove os anos a que o arquitecto chama esta cidade de casa. Passaram-se alguns dias do workshop quando, no dia 17 de Setembro, o grupo organizou uma Caminhada Exploratória na Conchada, com o apoio da antropóloga Sandra Xavier, inserida no Festival Apura. Foi um convite à comunidade para conhecer a história do bairro «um pouco marginalizada em relação à História de Coimbra», pela mão de quem o conhece bem.

O evento «correspondeu e excedeu as expectativas», diz Ivan, agora ao telefone. Participaram 20 pessoas. José Soares, morador, «falou de todos os processos sociais daquela zona, perceberam-se as lutas e fez-se um mapeamento». E agora? «Agora queremos fazer mais, possivelmente reunir todos os achados e reflexões num documento e perceber o efeito que têm em quem participa. No futuro, pode ser que surjam mais iniciativas para as zonas», continua Ivan.

Celas e Pedrulha estão na calha, bem como uma parceria com outro projecto de intervenção cidadã, o Jardim Monte Formoso, dinamizado por Catarina Maia. Será que vamos ver aparecer intervenções como mobiliário urbano improvisado nessas zonas também? «Pode ser que se estabeleça algo físico ou não, o importante é estabelecer diálogos com as pessoas», remata o arquitecto, mantendo o mistério que, no fundo, caracteriza o chamado urbanismo de guerrilha ou urbanismo tático, uma tendência actual na área da arquitectura que consiste num conjunto de acções com a finalidade de democratizar o direito à cidade. Através de pequenas ou médias intervenções urbanas, cidadãos propõem reparar a cidade «não desresponsabilizando os organismos da sua função, o objectivo é que depois ponham as coisas permanentes para as pessoas usarem». 

Até à publicação deste artigo, o Colectivo Zás não foi contactou nem foi contactado pela Câmara Municipal de Coimbra, mas Ivan diz que a porta está aberta para o diálogo e a ideia é o colectivo crescer e diversificar a sua constituição. Também deixa mais uma achegas sobre a cidade: «Depois de uma pandemia parece-me muito difícil não pensar no espaço público e falta muita coisa na cidade. Faltam espaços verdes, passeios, pensar na cidade não só para os carros mas para as pessoas. É essencial pensar a cidade não como um sítio para consumo. Os sítios onde podemos estar na rua não devemos ser obrigados a consumir para lá estarmos, ou pagarmos para entrar, não se devia pôr essa questão. O Parque Verde é um óptimo sítio para estar sem consumir, mas depois começamos a entrar na cidade e esses sítios desaparecem. O banco de jardim do Largo da Portagem está ali entre as mesas dos cafés, parece estranho ou difícil as pessoas sentarem-se ali. A Praça da República só tem bancos na periferia. Agora tem esplanadas mas foi por causa da pandemia.»

Vamos acompanhar este Projecto Cool. Fiquem atentos às novidades. Podem seguir o @zas.colectivo no Instagram e contactar através do email colectivo.zas@gmail.com.

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