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Coletivo Pescada Nº 5

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232° Celsius do Coletivo Pescada Nº 5 na Coimbra Editora

Este fim-de-semana o Coletivo Pescada Nº5 «desperta» a antiga Manutenção Militar

As questões trabalhistas e o sermão de Padre António Vieira dão o mote para mais uma ocupação artística de intervenção social num edifício adormecido da cidade. Por estes dias prepara-se «O Sal que não salga» que pode ser visitado nos dias 13 e 14 de Maio, a partir das 15h.

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Fotografia: Mário Canelas

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Coletivo Pescada Nº 5

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232° Celsius do Coletivo Pescada Nº 5 na Coimbra Editora

Depois do impactante 232º Celsius na Coimbra Editora, no ano passado, em O Sal que não salga o coletivo Pescada Nº 5 aborda as questões trabalhistas e dialoga com o sermão de Padre António Vieira, que, em junho de 1682, pregou nas terras brasileiras de São Luís, no Maranhão o seu Sermão de Santo António aos Peixes. Onde? No conjunto de edifícios cor de salmão (!) que não passam indiferentes no início da Avenida Sá da Bandeira, antigo matadouro e horta dos crúzios ou frades da Ordem de Santa Cruz, depois sucursal do Ministério da Guerra entretanto devolvida à Câmara Municipal de Coimbra, em 2017.

«Nós já tínhamos pensado em fazer aqui uma exposição, mas na altura isto pertencia ao exército, portanto nem sequer dei seguimento a essa possibilidade. Mais recentemente percebi que pertencia à Câmara, que tem um projeto muito interessante de transformar todo este quarteirão num quarteirão das artes, e fizemos a proposta», conta Carlos Júlio. Ficou definido num protocolo assinado entre a Direção-geral do Património Cultural e a Câmara Municipal de Coimbra, em Junho de 2020, que o edifício seria requalificado e adaptado para ser o novo Centro de Arte Contemporânea de Coimbra, actualmente a funcionar junto ao Arco de Almedina e o executivo também fala em «futura escola de artes», o que faz desta exposição uma espécie de ensaio.

«Fiquei contente de ser convidado. Sempre achei essa acção do Pescada um desafio muito interessante para o artista, o curador, quem está envolvido na arte neste contexto», diz Alex Lima. Encontrámos o músico brasileiro a preparar a sua instalação multimédia durante esta visita guiada ao espaço. Ele foi um dos artistas «pescados» pelo colectivo para compor a nova exibição efémera do grupo que usa a arte como instrumento de intervenção social. «O tema é muito relevante. Quando me falaram do sal, fiz uma viagem de volta ao Brasil, a um lugar específico que visitei que eram as salinas do Rio Grande do Norte. A situação do trabalhador naquela salina me incomodou muito e o jeito que ele terminava a vida. Ele termina definhando no sal. Aí falei: “Ok, vai ser lindo”.»

A beleza das infinitas possibilidades de ocupação de um espaço por um grupo de pessoas, artistas mas também outras cuja ocupação principal não é, habitualmente, no domínio da arte, e que abrangem áreas tão diversas como a pintura, escultura, desenho, fotografia, dança, teatro, música e performance. Um núcleo duro ao qual se juntam outras almas rebeldes e criativas, cuja identidade desta vez só vai constar no catálogo «propondo uma maior cumplicidade do gesto artístico com seu entorno».

Quem coze numa parede folhas de uma árvore da borracha, que existe na sua rua mas é originária de uma vasta região que vai desde o subcontinente indiano até à Malásia? Quem deita (ou acende) pingos de lume e quem conta a história da sala do forno, onde outrora se fazia pão depois de os sacos de farinha descerem pelo fotogénico escorrega verde? Qual será o Peso Certo? São coisas que só podemos descobrir este fim-de-semana, 13 e 14 de Maio, entre as 15h e as 22h ou as 15h e as 18h, respectivamente. A entrada é livre, como a criação e a interpretação do que por lá encontrarem.

«Em uma versão contemporânea, dentro de um microcosmos conimbricense, a exposição propõe um sermão que também poderia ser uma argumentação aos “pescadas”, pois desta vez formamos um cardume imenso, responsável por 64 obras que negociam algum tempero com a Manutenção. Ora, mas que tempero seria esse?», lê-se na introdução de Adolfo Caboclo, que começa com a inscrição em latim do evangelho de S. Mateus «vos estis sal terrae” (vós sois o sal da terra), para explicar a narrativa eleita para este «despertar da Manutenção Militar de Coimbra como espaço expositivo».

Estava muito sujo e «carregado de energia masculina» o prédio que esteve na posse do Exército Português entre os anos de 1899 e 2017. Agora, a dias da estreia, percorremos deslumbrados os espaços onde tanto conseguimos imaginar manobras fabris e de operações logísticas como um Chá das Cinco, que é uma das propostas da mostra, com doces para «devorar às 17h em ponto de Sábado». Foi o coletivo que limpou tudo. «É um princípio base que tem acontecido em todas estas exposições que é deixar os espaços melhores do que eles estavam. Isso pode ser através da limpeza, pode ser através do alertar para as condições de preservação de que eles necessitam, pode ser através de despertar, como tantas vezes já dissemos, de espaços que muitas vezes não têm essa visibilidade ainda na cidade», diz Inês Moura.

Alex Lima

O tema da escravidão também está presente neste ensaio do futuro da antiga Manutenção Militar. Afinal, «no mundo capitalista, trocam-se os rótulos e ficam as garrafas», escreve diz Adolfo Caboclo, lembrando dados de 2021 da Organização Internacional do Trabalho que estimam que cerca de 49,6 milhões de pessoas no mundo estão atualmente nessas condições (cerca de cinco vezes a população de Portugal), gerando um lucro de cerca de 150 mil milhões de dólares por ano e perdendo apenas para o tráfico de armas e drogas em termos de rentabilidade ilegal. A precarização também conta. «Esta [sala] aqui vai estar aberta e aqui os trabalhadores da Glovo que vão levar pizzas com
contratos precários a quem lhes faça as encomenda», atira Carlos Júlio, já no primeiro andar.

«Quando compramos algo, não pagamos com dinheiro. Pagamos com tempo de vida que
tivemos que gastar para ter aquele dinheiro. Mas tem um detalhe: tudo se compra, menos a
vida. A vida se gasta”.

José Mujica, agricultor e antigo presidente do Uruguai

À semelhança do que aconteceu na apresentação É Primavera no Paço no Paço dos Condes De Tentúgal, em 2021, e no Admirável Mundo Novo da Sociedade de Porcelanas de Coimbra, há três anos, o P5 propõe não só instalações como performances, a descoberta de objetos encontrados durante a preparação do sítio para a exposição e, desta vez, resultado de parcerias com a Biblioteca Geral e o Museu da Ciência da Universidade, o Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra e cidadãos da região das Marinhas de Rio Maior. «Vamos ter cá presente um prelo, que acho que é um objeto quase único ou o mais antigo prelo em ferro naquela tecnologia e vamos também ter a participação do sub-diretor Maia do Amaral, que vai fazer uma pequena performance, e convidámos o Museu da Ciência que tem uma coleção quase única de peixes trazidos de várias expedições científicas», avança Carlos Júlio.

O Sal que não salga é coorganizado pela Câmara Municipal de Coimbra mas as portas da antiga Manutenção Militar reabrem-se também com o apoio de muitos membros da sociedade civil. Portas e janelas porque, nas palavras de Inês Moura, «sempre que entramos aqui estão fechadas e isto tem a ver também exatamente com o apagamento do edifício na cidade, um edifício que acabou por ser saqueado, acabou por ser invadido, esteve fechado durante muito tempo e houve aqui uma ocupação, digamos assim; então cada vez que nós chegamos cá e o Carlos vai abrindo, vai deixando a luz penetrar novamente no espaço, isso é muito bonito».

Desde 2002 que o Coletivo P5 se dedicada à arte como instrumento de intervenção social, em torno de projetos que valorizam tanto a obra individual como a interação coletiva com o meio e a comunidade. Em acontecimentos fugazes e em espaços estranhos ao circuito habitual das exposições de arte, como edifícios urbanos muitas vezes num estado de abandono ou de transição entre diferentes utilizações, valoriza-se a arquitetura mas sobretudo a vida e o contexto em diálogo com o tema.

No catálogo d’O Sal que não salga apresentam-se «Guias de Remessa» onde o autor é o «cliente», acompanhado pela designação da sua intervenção e respectivos detalhes. Além de Júlio, Moura, Caboclo e Alex Lima participam: A. E. Maia do Amaral, Alda Reis, Ana Botelho, Ana Fróis, Ana Paula Inácio e Jorge das Neves Branco, António Patrão, António Samelo, Catarina Parente, Clara Moura, Cláudia Santos Silva e Filipe Paes, Henrique Vilão, Luísa Bebiano, Nuno Maia, Constança Duarte, Cristina Rufino, Diogo Oliveira, DrGica, Érica de Mello, Fátima Feliciano, Francisco Feio, Frederico Martinho, Frederico Nunes, Isabel Pires, Joana Nogueira, João Camões e Fernando Oliveira, João Condinho, João Mortágua, João Pidrança, Jorge Cabrera, Jorge Martinho, Jorge Simões, José Crúzio, José Geraldo, José Pedro Reis, José Távora, Luís Lucas Pereira, Maria Antónia Ferro, Martîm, Mirian Aires, Patrícia Miguel e Carlos Campos, Patrícia Sucena de Almeida, Paulo Jorge Lucas, Paulo Pereira, Rita Serra e Pedro Alípio, Rosana Ricalde e Felipe Barbosa, Rui Matos, Sofia Lobo, Sónia Honório, Tatiana Santos, Teresa Carrington, Teresa Valente, Tiago Mota, Vanda Ecm, Vitorino Coragem, Xana Eloy.

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