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Natureza e Património de Assafarge

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Património natural e edificado de Assafarge

Seguimos o rasto do Clube Natureza e Património de Assafarge

Há cinco anos que o grupo ambientalista cuida do património edificado e natural da freguesia de Coimbra, promovendo a ecoliteracia da população e preservando a memória intergeracional.

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Fotografia: Mário Canelas

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Património natural e edificado de Assafarge

A cidade de Coimbra está rodeada de zonas periurbanas, onde a extensão do alcatrão e a edificação de novos bairros-dormitório contrasta com os vestígios de um passado em que as pessoas dependiam da terra para viver, estabelecendo com ela uma relação de reciprocidade e respeito. A população de Assafarge vivia da oliveira, da vinha, das favas, do centeio e da cevada — culturas de pouca água. «As hortícolas eram raras e os finais do inverno eram aproveitados para semear rápido, antes da chegada do verão», conta-nos José Carlos, que conhece os caminhos que calcorreamos como as palmas das suas mãos.

Para além dos escassos recursos hídricos, os terrenos não eram aráveis, sendo necessário remover as muitas pedras existentes nos campos, para estes ficarem cultiváveis. Por este motivo, em Assafarge encontram-se uma série de estruturas feitas em pedra, relíquias com enorme valor histórico. As quelhas, por exemplo, são caminhos ladeados por muros baixos, adornados de musgo e fetos, através dos quais as pessoas se deslocavam de aldeia em aldeia, ou subiam à ermida de Santo Amaro para pagar a sua promessa ou na exaltação da romaria.

Já as cortelhas são “construções de pedra solta, sem aparelho algum, casotas trogloditas que parecem saídas de tempos ante-históricos, conservadas por milagre nos ermos”, escrevia o professor da Universidade de Coimbra, Virgílio Correia, em 1915. Serviam quem andava nos montes a passear os rebanhos ou a desbravar mato, em caso de mau tempo, pois a técnica aperfeiçoada ao longo de séculos impedia a infiltração de água, sem recurso a barro ou a cimento. Estes artefactos passam despercebidos aos olhares pouco atentos. Para além disso, José Carlos receia que estas construções venham a ser degradados, por ignorância ou má-fé, tal como aconteceu com a terraplanagem levada a cabo o ano passado, com vista à construção de uma central fotovoltaica em Cernache – projeto aprovado em janeiro de 2021, com voto contra do atual executivo – que levou à destruição de dezenas de cortelhas. «Só escapou uma», afirma o morador.

Lutas que se cruzam: a qualidade de vida passa pela defesa da terra

Com vista à preservação do património natural e edificado da zona, foi criado, em janeiro de 2018, o Clube Património e Natureza de Assafarge. No final de 2017, instalava-se o luto pelas áreas ardidas depois de um verão pintado a preto e ceifado por incêndios. Dois jovens com raízes na freguesia decidiram, então, organizar uma recolha de sementes de vegetação endémica, com o objetivo de criar um viveiro que servisse a reflorestação das zonas devastadas. O ímpeto foi suficiente para motivar o Centro Recreativo de Assafarge a criar um grupo dedicado ao ambiente.

Celebravam-se dez anos desde a publicação do livro Memórias e Património de Assafarge, uma recolha do Grupo Etnográfico do Centro Recreativo que reúne as histórias dos mais velhos, as rezas populares e as mezinhas. Desde a sua criação, o Clube Natureza e Património de Assafarge tem prosseguido este trabalho, resgatando saber ancestral e estimulando o debate em torno de temáticas urgentes. Foram
organizados percursos interpretativos, oficinas e tertúlias. «Temos de reconectar as pessoas à terra, porque há uma geração que está a desaparecer e eles (idosos) são bibliotecas vivas», afirma a bióloga e membro do Clube, Cristina Seabra.

Abrigada da chuva à porta de sua casa, recorda que, nos anos 90, o seu quintal estava cheio de vida: «Havia uma abundância de tudo: besouros, libelinhas, borboletas, gafanhotos. Houve uma redução brutal da biodiversidade de insetos, o que tem muito a ver com o uso de inseticidas e herbicidas». A poluição é uma preocupação central para os sócios do grupo porque reconhecem que, «por toda a parte, temos contaminação dos solos, da água e do ar», acrescenta. Por isso, têm vindo a alargar o seu campo de ação, tendo dinamizado, o ano passado, uma conversa sobre a qualidade do ar em Coimbra.


O desejo de Cristina Seabra é promover a ecoliteracia da população, com a certeza de que os pequenos gestos são essenciais para proteger e promover a biodiversidade. O corte excessivo de vegetação, por exemplo, incluindo a desmatação de plantas silvestres «espontâneas» – vistas como «daninhas» –, ou o crescente abate de árvores para a queima residencial, são apontados como fatores que prejudicam a fauna e a flora local e que poderiam ser contornados se houvesse uma maior sensibilização.

A página Natureza e Património de Assafarge no Facebook conta com mais de dois mil seguidores. Para a bióloga, as redes sociais são uma ferramenta muito importante na divulgação do trabalho desenvolvido pelo Clube: «A nível de divulgação dos eventos é muito útil, porque conseguimos alcançar um público mais amplo». Contudo, admite que a maior dificuldade é atrair as pessoas da localidade, bem como os jovens. O exímio conhecedor da área, José Carlos, reforça: «O que nós temos aqui é um fenómeno de envelhecimento e, depois, as pessoas têm uma atração terrível pela televisão e pelo sofá. O nosso público é muito heterogéneo, muito caçado nas redes sociais, mais gente de fora do que de cá».

Criar laços, de olhos posto no futuro


Apesar das dificuldades, o Clube Natureza e Património de Assafarge tem várias ideias para concretizar, à espera de serem impulsionados em parceira com as instituições públicas: uma mata pedagógica junto ao Castelo da Abrunheira, projeto protocolado com a Universidade de Coimbra e a Junta de Freguesia de Assafarge e Antanhol; ou a colocação de sinalética nos vários trilhos pedestres que atravessam a zona, e consequente divulgação.

Até ao momento, foram definidos três percursos principais, todos eles circulares, e, segundo o associado José Carlos, a Câmara Municipal de Coimbra (CMC) já mostrou interesse em apoiar este trabalho: «A CMC pretende ligar todas as terras do concelho por trilhos pedestres. Enviaram três técnicos a Assafarge e tivemos algumas reuniões. Estamos à espera de ser contactados de novo».

O futuro de Assafarge reside, também, nas novas histórias que se vão tecendo, nos jovens que escolhem a freguesia como novo lar, chegando com a curiosidade aguçada e vontade de ter um impacto positivo no contexto em que residem. «Confesso que quem me ensinou a apreciar o que temos foi gente de fora que veio para cá morar. Porque nós passamos pelas coisas todos os dias e não valorizamos», manifesta José Carlos.

Os afiliados do Clube Natureza e Património nomeiam, com entusiasmo, o fundador da primeira ONG com sede em Coimbra — MilVoz —, Manuel Malva, ou o engenheiro agrónomo Cláudio Carvalho, que tem comprado terrenos para potenciar a agricultura familiar. O objetivo de todas estas pessoas passa por criar uma relação não-hierárquica com o meio que os rodeia e com todas as espécies vegetais e animais que compõem a complexa rede de interligações das quais o ser humano depende. Trata-se de cuidar, com carinho, e de plantar sementes para fazer crescer um futuro mais sustentável e equilibrado.

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