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Catarina Moura: «É preciso pessoas de fora virem trabalhar com pessoas de Coimbra.»

Tem um filho de onze anos, Miguel, e volta e meia pensa na questão das influências. «O que é que ele ouve? O que é que eu ouvia na idade dele? Até que ponto é que isso me influenciou?» Ele ouve de tudo. Ela nem tanto. Lembra-se de José Barata Moura quando era pequena que, […]

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Fotografia: João Azevedo (@joaoazevedophoto)

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Brigada Vitor Jara

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Taleguinho

Tem um filho de onze anos, Miguel, e volta e meia pensa na questão das influências. «O que é que ele ouve? O que é que eu ouvia na idade dele? Até que ponto é que isso me influenciou?» Ele ouve de tudo. Ela nem tanto. Lembra-se de José Barata Moura quando era pequena que, desde logo, acha que lhe permitiu um bom exercício de sílabas. «Dizem que eu digo muito bem as palavras.» O «Fungagá da Bicharada» tinha uma métrica difícil, mas Catarina Moura decorava aquilo tudo, e também Ana Faria e os Queijinhos Frescos e a colecção inteira de José Afonso, publicada pelo Círculo de Leitores.

Nasceu no Entroncamento mas viveu em muitos lugares, a começar pela periferia de Lisboa que, na década de 80, tinha uma oferta cultural que fervilhava. De Alhandra a Alverca e Vila Franca de Xira, «ia ouvir Júlio Pereira, Trovante, Carlos Paredes, e acabei por apreender tudo da música portuguesa. A música anglo-saxónica é um branco na minha vida, os meus pais não me proporcionavam essa música e a rádio estava sempre sintonizada na Antena 1». Ainda vieram os amigos com os «Hit Parades», mas a viajar Portugal fora o que ela ouvia eram as cassetes da Brigada Vitor Jara. Ainda nem ela desconfiava.

Mudando de moradas como quem gira discos, de Forte da Casa à Póvoa de Santa Iria, a energia ia toda para a próxima paragem. «Gosto de estabelecer novas relações e conhecer pessoas. Coimbra agora é a minha casa e, mesmo aqui, estou sempre a conhecer gente nova.» Antes disso, já queria cantar, mas era aquela coisa: «Artista? Não vais ter trabalho.» Os pais até quiseram que aprendesse um instrumento, mas o acordeão não convenceu. «Puseram-me na dança rítmica e eu não tinha jeito para aquilo.» No 12º ano, de volta ao Entroncamento, entrou no coro de alunos e professores e quis ir para os Açores estudar Biologia Marinha e Pescas. Gostava de mar. Mas de novo o pai: «Para os Açores? Nem pensar.»

Tinha 17 anos quando entrou na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação, em 1993. «Pensei: Vou para Coimbra e ainda vou para a Brigada. Mas era como um sonho, nunca pensei.» Primeiro foi o Orfeon Académico de Coimbra, mas desistiu porque não sabia ler partituras. Na Orquestra Típica e Rancho da secção de Fado da Associação Académica de Coimbra fez parte da direcção artística e pesquisou sobre trajes e folclore de Coimbra. Lembra-se de fazer uma palestra numa eira com Louzã Henriques sobre ourares e achar aquilo maravilhoso. Já fazia parte do Núcleo de Estudantes da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação, de uma assembleia de representantes e de um conselho directivo quando chegou ao GEFAC – Grupo de Etnografia e Folclore da Academia de Coimbra. O pai sempre a dizer: «Tu estás lá é para estudar!», e Catarina perdeu um ano mas encontrou muita coisa.

Na faculdade, toda a gente pensava que era a Anabela. «Era muito parecida, ainda por cima eu era pequenita e punham-me logo a cantar.» Descobriu que a música tradicional portuguesa não era só folclore no GEFAC e apaixonou-se pelo cancioneiro popular de Michel Giacometti, o teatro mirandês e os espectáculos com uma componente cénica e as músicas interligadas. «Foi um mundo que se abriu.» Ainda apanhou Luís Pedro Madeira nalguns ensaios, mas os caminhos só se cruzariam mesmo mais tarde. Os estudos continuavam e, ao mesmo tempo que fazia parte da fundação das Segue-se à Capela, começava a dar formação para adultos e depois seguia para trabalhar como mediadora num dos chamados Centros Novas Oportunidades, em Santa Comba Dão. «Um trabalho lindíssimo, com pessoas maravilhosas, que sinto que mudou a vida de muita gente; ao nível das novas tecnologias então foi fundamental.»

Um dia, a Brigada Vitor Jara decidiu procurar uma nova voz. Fazia 30 anos e gravava uma colectânea de temas com o GEFAC. «Achavam que precisavam de uns agudos» então Catarina, mesmo já não fazendo parte do grupo, foi chamada a participar. Gravou-se a «Cana Verde», seguiu-se a digressão e uma série de peripécias e substituições, com improvisos e programas de televisão pelo meio. Acabaria por tornar-se a (única) voz feminina do grupo. «Era a minha referência! Ouvia aquilo com os meus pais!» O mesmo pai que dizia: «Tu estás lá para estudar!» e que, naquele momento, ela congeminava: «”O que é ele há-de pensar? Agora sou importante.” Ganhava cachet e aquilo complementava as formações.» 

Naqueles primeiros tempos, quando subia ao palco com a Brigada, sabia que achavam que era «filha de um deles». Apesar de ser a única mulher, sentia-se como igual. «No início mais inibida, agora um bocadinho mandona.» Num período de desemprego na área de formação, era Miguel muito pequeno, lembra-se de ter começado a prestar atenção os miúdos nos concertos e pensar que «aquelas músicas serviam perfeitamente para eles, era só dar-lhes uma outra moldura» e do contacto com o Teatro da Cerca de São Bernardo, que começava a pensar nos Sábados para a Infância, nasce o Taleguinho, com o companheiro Luís Pedro Madeira. Os sacos de pano de retalhos e «esta coisa de coser cantigas e histórias» deram num frenesim de «Ficar a ver Estrelas» com o «Mundo ao Colo», cheio de «Doce de Língua Salgada» e onde «Até Cantar Dá Trabalho».

No Projecto Educativo e Mediação de Públicos do Convento São Francisco e com as visitas «Por um Fio», Catarina Moura apaixonou-se outra vez pela descoberta da cidade. «Sempre gostei de passear e de me infiltrar em visitas guiadas, e o interesse que eu tenho pela história de Coimbra e aquilo que aprendo depois replico às pessoas.» Quando conta um conto, acrescenta um ponto e o fio vai esticando, esticando, esticando, como o seu público. «No final sento-me e converso com as pessoas sobre a programação e penso que o dinheiro não é um factor para as afastar destes espaços, é a ideia de que não é para elas. As pessoas não se sentem na condição social, cultural, o que seja, para entrar em certos espaços. Quando as companhias vêm a Coimbra, ficam surpreendidas pelo facto de os nossos públicos não serem da universidade. Mas eu lembro-me de o [Teatro Académico de] Gil Vicente estar sempre cheio. Acho que o facto de haver menos tempo, com cursos de três anos, influencia.»

Catarina consome muita cultura, mas sente que, em Coimbra, cada vez mais vai encontrando os mesmos públicos. «Mas ao nível da música é muito interessante, porque vamos todos ver as coisas uns dos outros, mesmo que não seja uma música com que a gente se identifique. É importante a humildade. Acharmos que somos melhores, acho que isso em Coimbra não há. Como agora há muita coisa, começamos a estabelecer redes. Mas é preciso pessoas de fora virem trabalhar com pessoas de Coimbra. Acho importante outro olhar, para as pessoas verem as coisas de outra forma. É tão importante as pessoas irem ver coisas. Na visita acabo sempre a dizer: “Não venham ver coisas que conhecem, arrisquem, no máximo se não gostarem dormem.” As pessoas precisam que outros da sua condição lhes digam: “Aquilo é muito giro, vai ver!”». Lá estão as influências.

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