«Coimbra, mais que uma cidade, um gigante parque de estacionamento!», é como a página Coimbra Parques retrata, na rede social Twitter, o problema do estacionamento selvagem em diferentes locais da cidade de Coimbra. Esta conta, gerida por uma pessoa que reside em Coimbra e que prefere manter o anonimato, publica, regularmente, fotografias de carros estacionados em cima de passeios e passadeiras para peões e de zonas públicas relvadas.
Em Dezembro de 2021 e já no início deste ano, o presidente da Câmara Municipal de Coimbra, José Manuel Silva, abordou o tema do estacionamento anárquico, tendo mostrado uma vontade firme de uma actuação com «muita intensidade» da Polícia Municipal. O autarca local apontou as consequências negativas deste tipo de estacionamento para o trânsito, para pessoas de mobilidade reduzida e carrinhos de bebé, e ainda para veículos de socorro.

Entrevistámos a pessoa responsável pela conta no Twitter, que designaremos por Coimbra Parques, sobre as motivações que conduziram a esta iniciativa cidadã de denúncia.
Joana Pires Araújo (JPA) – Quando deu início a este projecto e qual o principal objectivo?
Coimbra Parques (CP) – A página [Coimbra Parques, na rede social Twitter] começou no início da pandemia, mas já estava na cabeça há algum tempo. Um dia, foi a gota de água: «é hoje que vou começar». Estava a ir para a fisioterapia muito cedo de manhã, perto do Hospital, e uma pessoa estacionou à minha frente, no passeio – e é isto que me choca, a leviandade das pessoas – e havia imensos lugares. Não era uma emergência. Resolvi criar um perfil no Twitter, não quis ir para o Facebook, ainda me tentavam matar a mim ou às pessoas que fotografo. (risos)
JPA – Qual a motivação? O que pretende que aconteça com esta sequência de publicações?
CP – Eu queria chamar a atenção dos decisores políticos. Se a página começasse a ter visibilidade, talvez isso pudesse acontecer. Na realidade, acho que há um desleixo grande da parte de quem pode fazer alguma coisa. Há zonas em Coimbra onde é recorrente o estacionamento abusivo e não há quaisquer consequências.

JPA – Tem algum tipo de critério ou cuidado ao fotografar carros estacionados em locais indevidos? Já houve alguma reacção por parte dos condutores?
CP – Tento ver a pessoa que estacionou, pode haver situações de emergência. Fotografo quando é desleixo e percebo que não há emergência. Já me interpelaram, perguntam-me qual é o meu problema, costumo responder que o problema são eles. Às vezes, as pessoas justificam-se. Outras vezes, começam a bem, com uma atitude humilde, e depois vão ficando mais agressivas, mas nunca tive ameaças físicas.
JPA – Sente que este projecto tem impacto e que as pessoas mudam o seu comportamento ou tornam-se mais conscientes dos seus erros?
CP – Quando converso com as pessoas, nunca senti que, na altura, estivesse a surtir efeito, mas acredito que, depois de as ter interpelado, tenham reflectido um pouco sobre o que acabei de lhes dizer e mudem atitudes. Já falei com pessoas que conheço e corre melhor. Uma delas estacionava em frente à escola dos filhos, no passeio, quando ia buscar as crianças à escola. As crianças começam a tomar isto como normal. Também aconteceu com alguns vizinhos a quem chamei a atenção: «pode vir uma criança num carrinho de bebé, pode vir uma pessoa numa cadeira de rodas», mudei algumas mentalidades ali à minha volta. E houve um a quem mudei à força: a polícia ia a passar, pedi para pararem e eles multaram o carro mal estacionado.

JPA – As imagens são todas suas?
CP – As pessoas começaram a enviar mensagens e fotos e eu partilho sempre, era o que queria. A intenção era que não fosse só eu, queria que a página não se centrasse em pessoas mas num movimento, daí o anonimato.
«As cidades têm de ser dos cidadãos e não dos carros. Há passeios em Coimbra que estão completamente destruídos. Se não há respeito pelas pessoas, pelo menos devia haver pelo património.»
Coimbra Parques
JPA – O que acha que se deve fazer para mudar mentalidades e reduzir o estacionamento selvagem em Coimbra?
CP – Apesar do valor da multa ter aumentado, continua a não ser dissuasor. As pessoas sentem impunidade e estacionam em qualquer lado. Há locais que são crónicos, onde há sempre carros estacionados em cima do passeio ou em cima das mesmas passadeiras: ao pé das finanças, ao fundo da rua do Brasil, a diferentes horas do dia. O presidente [da Câmara Municipal de Coimbra] tinha dito que isto ia acabar mas não vejo nada. No dia do cortejo da Queima das Fitas, não havia um passeio na zona histórica e envolvente que não tivesse carros. O mesmo aconteceu no dia do rally, as pessoas com carrinhos de bebés tinham de ir pela estrada. A polícia estava ali, mas alguma coisa tem de mudar nas directivas que eles recebem, as coisas têm de ser pensadas.

O telefonema estava a chegar ao fim, depois de Coimbra Parques comentar algumas das fotografias partilhadas publicamente, e a conversa terminou em jeito de manifesto.
CP – Sempre defendi que os passeios são para as pessoas. Isto não acontece só em Coimbra, mas era preciso começar a mostrar. Gostava que as pessoas se envergonhassem das suas infracções. A naturalidade com que os carros sobem os passeios, os peões afastam-se. As cidades têm de ser dos cidadãos e não dos carros. Tens passeios em Coimbra que estão completamente destruídos, se não há respeito pelas pessoas, pelo menos devia haver pelo património.
