O centro histórico de Braga sofreu uma enorme revolução nos últimos anos. A antiga Bracara Augusta, com mais de 2000 anos de história, é a mais antiga cidade portuguesa e uma das cristãs mais antigas do mundo, mas é também hoje uma das mais jovens da Europa. Fundada pelos romanos no ano 16 a.C., a longa história da antiga Bracara Augusta é visível nos monumentos, igrejas e casario centenário e convive energicamente com a cultura, o comércio e os serviços, depois de uma intensa revitalização.
As ruas pedonais do centro histórico da também conhecida como Cidade dos Arcebispos estão cheias de comércio tradicional para todos os gostos, acessível a diferentes bolsos e com animação permanente. Os locais históricos foram preservados e são palco de convívio entre gerações, inclusive em cafés históricos como o Vianna e A Brasileira. Responsáveis da Câmara Municipal de Braga afirmam que a é uma das cidades nacionais cujo centro histórico mais tem sido dinamizado. Com Coimbra à procura de soluções para a revitalização da sua Baixa, procurámos saber junto da autarquia da cidade minhota e outros intervenientes quais foram as medidas tomadas. Explicaram-nos que a regeneração urbana foi uma das chaves, bem como a penalização dos proprietários de edifícios degradados com a majoração do Imposto Municipal sobre Imóveis.

«Com vista a penalizar a inércia de quem remete para o abandono e a degradação alguns dos edifícios localizados no Centro Histórico, o Município implementou o processo de majoração de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) para prédios degradados», revela Ricardo Gomes. O porta-voz do Gabinete de Comunicação da Câmara Municipal de Braga sublinha «que o centro tem vivido, nos últimos anos, uma elevada dinâmica de revitalização e valorização patrimonial» e, por isso, «apresenta-se como um espaço muito estimulante de promoção imobiliária, potenciando a regeneração urbana e a reanimação do centro da cidade». «Privilegiamos a restauração à reconstrução, mantendo a autenticidade dos locais. A esta dinâmica não é alheia a componente social e cultural do centro que temos também vindo a promover intensamente, com diversas iniciativas de diferentes índoles que atraem as pessoas à zona», remata.
Fátima Pereira é arquitecta e foi assessora do então vereador da Reabilitação Urbana da autarquia (à altura, Miguel Bandeira), entre 2013 e 2021. Em conversa com a Coimbra Coolectiva, lembra os desafios que encontrou. «Em 2013 o mercado imobiliário estava estagnado o que exigiu a concertação de iniciativas públicas e privadas em matéria de reabilitação urbana. Aos investimentos públicos previstos foi necessário associar incentivos aos privados e penalizar a inércia de quem pretendia ficar parado com o imóvel a entrar em estado de ruína. Braga tem mais de 2000 anos de história e isso tem que ser a base de qualquer política pública. Por isso, ao mesmo tempo, foi uma das grandes preocupações acrescentar valor à reabilitação, qualificar as intervenções em matéria de valorização patrimonial e criar dinâmicas culturais que permitiram projetar a cidade a nível internacional e com isso a procura turística», descreve.


No início de todo o processo de revitalização do centro histórico de Braga, foram definidas prioridades. «O desígnio de que o património e a singularidade de Braga: as suas lojas históricas, os monumentos e a paisagem, fossem a base para um crescimento sustentado onde se valoriza as pré-existências e a ocupação histórica aliada à inovação, à projeção turística e à criação de emprego, factores que fazem hoje de Braga uma cidade feliz para viver, trabalhar e estudar”, explica Fátima Pereira. A consequência foi um aumento do investimento para a recuperação de edifícios degradados no centro histórico, sobretudo a partir de 2016, «com a localização de novos estabelecimentos comerciais e com um aumento do número de pedidos de licenciamento para obras de habitação, assim como de alteração de licença dos edifícios de serviços para habitação», destaca Ricardo Gomes, da Câmara Municipal de Braga.
Sobre a majoração do IMI, Fátima Pereira recorda que, em 2020, foi agravado o IMI para 183 imóveis que não reuniam as mínimas condições de habitabilidade, tendo-se ainda atualizado o levantamento e registo dos prédios degradados. «De 2013 para 2014, foi duplicado em Braga o número de imóveis para agravamento de IMI (74 – 159) e mais do que triplicado em 2020. Da mesma forma, foram aumentando paulativamente o número de pedidos de obras de conservação, incentivando deste modo a reabilitação e o restauro impedindo situações de ruína iminente, como se assistiu no passado», sublinha.

Hotel foi ponto de viragem
Ainda que a preservação das lojas históricas fosse uma das grandes prioridades, Braga não fechou as portas à entrada de novos negócios e outros investimentos. Daí que Fátima Pereira destaque como ponto de viragem na mudança do Centro Histórico a abertura do Hotel Vila Galé, nas instalações do antigo hospital bracarense. «Para além do Vila Galé, houve o investimento na reabilitação da Pousada da Juventude e a intervenção no Mercado Municipal de Braga que, associadas à dinâmica cultural e à intervenção privada, vieram qualificar o Centro Histórico», completa.
No caso dos negócios, Braga tem também, à semelhança de Coimbra, o programa municipal Lojas com História, em que os proprietários dos estabelecimentos podem candidatar-se à isenção do pagamento do IMI, num processo promovido e agilizado pela Câmara Municipal de Braga. Segundo Fátima Pereira, foram reconhecidas e classificadas 44 Lojas com História, que fazem parte das memórias comerciais e da história da cidade. Já quanto à habitação, são atribuídos incentivos específicos em matéria de reabilitação urbana, destacando-se a taxa reduzida de IMI para obras de reabilitação no centro histórico.

Edifícios históricos: o exemplo da Casa Rolão
Um dos edifícios históricos aproveitados no centro de Braga é a Casa Rolão, um edifício do século XVIII que tem sido a sede de produtos culturais, muito por acção dos proprietários. É lá que funciona a livraria Centésima Página, entre outras actividades. «Foi um local onde, até 2005, muitas bandas ensaiaram. Depois abriu a livraria e, depois dela, surgiram outros espaços na casa, todos dedicados à produção cultural», explica-nos Rafael Machado, proprietário da Casa Rolão. As regras são bem definidas: os espaços estão para arrendamento para produtores culturais e com rendas abaixo dos preços do mercado. «Preferimos escolher a ser escolhidos», revela o proprietário.
Rafael Machado admite que a Centésima Página tem servido como uma espécie de loja-âncora para a casa, uma vez que é a que atrai mais gente para o espaço. Aponta que esta está sempre cheia, com bons ritmos de entradas e saídas, e com espaços de fruição, como o jardim, a esplanada e a cafetaria. Nos restantes espaços da casa está um profissional de fotografia e vídeo, uma empresa de multimédia, uma de arte digital, arquitectos, uma loja de roupa de autor e uma de mobiliário vintage. «Há um interesse em ter um perfil específico e uma harmonização dos espaços», remata.
